09/05/2010

Egoísmo... Na Noite de Chuva...




Bem que gosto da chuva a escorrer dos telhados...



a olhar-me com seus olhos vagos e molhados,



e a cirandar com o vento, e a cantar nas esquinas...



E gosto de espiar ao longe, as ruas curvas,



pelo olhar das vidraças molhadas e turvas



embuçadas no véu friorento das neblinas...







Paro de ler às vezes, esquecido, um instante,



e olho a rua estirada... a rua que está morta...



Chove... que há de fazer aquele vulto adiante,



encolhido e encostado ao vão daquela porta ?







Nesses dias assim eu me sinto sozinho...



Egoísmo o meu talvez, só penso em meu conforto...



E o homem que se foi, molhado, no caminho ?



e o barco que sumiu na neblina, sem porto ?







Sinto-me bem... Lá fora pelas ruas quietas,



pelas ruas molhadas, úmidas, sombrias,



passam sombras fugazes, rápidas, discretas



e erradias...







Ouço a chuva que chove... A chuva cai nas ruas.



Aqui dentro, que íntimo bem-estar me invade !



Mas... por onde andarão aquelas crianças nuas



que eu vi num bairro triste e longe da cidade ?







Mas eu gosto da chuva, a chuva me faz bem...



Há dias em que a dor da minha alma é cinzenta,



tenho uns vagos desejos de escutar Chopin



enquanto a chuva chove, enquanto o vento venta...







Tão bom a gente ouvir a chuva assim lá fora



e encolher-se entre quentes lençóis, inconsciente,



sem pensar.. . sem pensar... como eu pensei agora



que há alguém num vão de porta a tiritar doente...



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Meu Deus, por que hei de estar me entristecendo à toa



se essa chuva que canta é tão suave... é tão boa...

...


( Poema de J. G. de Araujo Jorge - do livro



Eterno Motivo

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