31/08/2010

Fim

O que eu perdi não foi um sonho bom,

não foi o fruto a embebedar meus lábios,

não foi uma canção de raro som,

nem a graça de alguns momentos sábios.


O que eu perdi, como quem perde uma outra infância,

foi o sentido do enternecimento,

foi a felicidade da ignorância, foi, em verdade,

na minha carne e no meu pensamento,

a última rubra flor do fim da mocidade.


E dói - não esse gesto ausente, a que se apagam

as flores mais solares, mas uma hora,

- flor de momento numa breve aurora -

hora longínqua, esquiva e para sempre morta,

em cuja escura, inacessível porta

noturnos olhos cegamente vagam.


Abgar Renault
(1901-1995)

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