10/08/2010

Canção na plenitude

Canção na plenitude


Não tenho mais os olhos de menina

nem corpo adolescente, e a pele

translúcida há muito se manchou.

Há rugas onde havia sedas, sou uma estrutura

agrandada pelos anos e o peso dos fardos

bons ou ruins.

(Carreguei muitos com gosto e alguns com rebeldia.)

O que te posso dar é mais que tudo

o que perdi: dou-te os meus ganhos.

A maturidade que consegue rir

quando em outros tempos choraria,

busca te agradar

quando antigamente quereria

apenas ser amada.

Posso dar-te muito mais do que beleza
e juventude agora: esses dourados anos
me ensinaram a amar melhor, com mais paciência

e não menos ardor, a entender-te
se precisas, a aguardar-te quando vais,

a dar-te regaço de amante e colo de amiga,

e sobretudo força — que vem do aprendizado.

Isso posso te dar: um mar antigo e confiável

cujas marés — mesmo se fogem — retornam,

cujas correntes ocultas não levam destroços

mas o sonho interminável das sereias.




O texto acima foi extraído do livro "Secreta Mirada",
Editora Mandarim - São Paulo, 1997, pág. 151.

Lya Luft

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