Penso isto: penso que devemos fugir para nós mesmos.
Não são apenas os amigos que nos levam sem reação,
são os cinemas, os teatros, as horas que perdemos nas ruas
quando nosso quarto se fecha silencioso, sem tempo
e esperanças.
Não são apenas as horas que o trabalho me rouba
inapelavelmente, e que não me serão devolvidas.
É a nossa vida, feita sem tempo e de desencontros,
sem pausa para a criação, sem paz para o recolhimento,
sem silêncio para o pensamento, sempre ininterrupta,
passando por nós, enquanto nos deixamos ficar sem alcançá-la...
Penso isto: só a fuga para nós mesmos seria a salvação.
Conheço um amigo pintor que se encontrou em Itatiaia
e ouve o canto dos pássaros e das águas junto às Agulhas Negras.
Meu amor: sinto que vamos chegando à hora em que
devemos voltar ao Paraíso,
ou jamais o reconquistaremos.
(Poema de J. G. de Araujo Jorge,
do livro Antologia Poética - 1978 )